Thiago Aresta*
Ele está de volta ao clube que
costuma chamar de “casa”, clube que o revelou, formou, projetou, clube que,
após ouvir inúmeras vezes o grito de “Bota pra vender!” da torcida, o envolveu
numa troca pela chegada do grande Vampeta, mesmo o clube mal sabendo que, ainda
que por vias tortuosas, estaria, dessa forma, selando o destino desse jogador.
Do Flamengo à Inter de Milão, (fazendo gol logo na estreia, o da vitória, de
falta, contra o Real Madri, no Santiago Bernabéu) depois, empréstimos a Parma e
Fiorentina e a volta ao clube nerazurro.
Esse foi o caminho que o moleque da Vila Cruzeiro percorreu até que recebesse a
alcunha que carrega consigo até hoje. Esse moleque é o Adriano Leite Ribeiro, o
“Didico”. Mas pode chamar de “Imperador” que ele também atende!
Ser chamado de “Imperador” dá a
exata dimensão do que foi o Adriano em sua carreira internacional: um jogador
forte, decisivo, que tinha a capacidade de resolver jogos com sua patada de
canhota. Um jogador poderoso. E com grande poder, sabemos, vem grande
responsabilidade. O que, convenhamos, não foi um forte do Adriano ao longo de
sua carreira. O problema do Adriano, ao meu ver, é a falta de limites, o que
pode se justificar até pela sua trajetória: num dia, ele é um garoto que está
surgindo num grande clube, cercado de expectativa e, como vem de origem
humilde, algumas vezes não tem nem o dinheiro para a passagem de ida e volta ao
treino; no outro, ele acorda em Milão, numa cidade cosmopolita, um outro mundo,
outra cultura e, com o “boom” do mercado, muito mais dinheiro. Uma ascensão
meteórica que, sim, pode deslumbrar o mais centrado dos seres humanos. Aliado a
isso, está o fato de que, pensem comigo, todo o dinheiro que um jogador de
futebol faz no auge de sua carreira, ele não tem tempo de aproveitar da maneira
que gostaria, dados os compromissos com o clube e sua condição de atleta.
Gostar da sua comunidade,
frequentar o lugar onde foi criado só depõe a favor dele, pois, apesar de ter
ganho o mundo, ele não renega suas origens, o lugar de onde veio, é autêntico,
não dissimula seus gostos e hábitos; o que pode prejudicar é o que ele faz com
toda essa liberdade que diz sentir quando está em sua comunidade, na companhia
dos seus. Dizem que seu calcanhar de Aquiles é o álcool, que teria surgido como
muleta em razão da solidão e da perda trágica de seu pai (não posso afirmar,
nunca parei pra beber uma cerveja com o Impera, uma pena, pois além de conhecer
um cara do qual sou fã, renderia ótimo papo que, óbvio, viraria mais um texto,
ele fatalmente pagaria a conta). Se isso for um fato, concordo integralmente
com a opinião do grande jornalista, escritor e rubro-negro Ruy Castro em
entrevista ao programa Redação SporTV de 22-08-2012 (vocês podem ver aqui: http://goo.gl/Vk3DA). Não vou me atrever a
resumir a fala do Ruy, pois se trata de um depoimento pessoal sincero, direto,
chocante e que faz pensar, mas, o que fica dela é: quem tem uma condição
crônica, uma doença, necessita de tratamento, ajuda.
Ajuda foi o que o Adriano mais
teve ao longo de toda a sua carreira. Na própria Internazionale, dizem, era
comum que o Adriano se referisse ao Massimo Moratti, presidente do clube
italiano, como “pai”. A partir daí, começa a sequência interminável de “última
chance da carreira” que o Imperador teria, primeiro com um empréstimo de seis
meses ao São Paulo (2008), a volta à Inter, de onde se desligou após um
“sumiço” e teve a sua primeira volta ao Flamengo, em 2009, quando, mesmo longe
da condição física ideal, conduziu o rubro-negro ao hexacampeonato brasileiro
naquele ano, jogando um só turno e, ainda assim, sendo artilheiro. No ano
seguinte, a volta à Itália, para jogar na Roma: uma passagem de oito jogos e
muitas lesões, que terminou com mais uma rescisão de contrato. Todos esperavam
que sua redenção viesse no Corinthians, clube que se mostrou disposto a
acolhê-lo, mesmo após a recusa do Flamengo, pois, na época, ele não se
encaixava no “pojeto” do “pofexô” que treinava o clube carioca. Só que uma
grave lesão no tendão de Aquiles atrapalhou todo o planejamento. Fez poucas
partidas no Timão, fez um gol importante na campanha do título brasileiro de
2011, mas saiu de lá demitido, por justa causa, devido a 67 faltas em sessões
de fisioterapia e treinos, segundo o clube paulista (o que acho um certo exagero,
pois, quem falta a tantas sessões assim, ainda mais se tratando de uma lesão
grave e numa pessoa tão grande e pesada como o Adriano, não conseguiria nem
andar, mas não posso contestar os dados do clube).
O benefício do eterno perdão é
raro e acontece para poucos. Um desses poucos é o Adriano, o “Imperador”: ele
acaba de fechar contrato de produtividade com o Flamengo, após passar por nova
cirurgia no tendão de Aquiles e iniciar a recuperação no clube. Muito positivo
o Flamengo ter posto seu estafe e instalações à disposição do Adriano, mostra
um pouco de compromisso do clube com seus ídolos, o que, convenhamos, não tem
sido o forte dessa gestão. E o que esperar do Adriano? Bem, se ele ainda se
considera um jogador de futebol, ele tem de agradecer ao Corinthians, que
apostou nele quando nem o próprio Flamengo quis arriscar. E essa recusa do
Flamengo parece ter doído no Imperador, que se mostra motivado e determinado a
provar que pode, sim, dar a volta por cima e voltar a jogar futebol, se não em
grande nível, pelo menos regularmente, num primeiro momento. O Adriano tem só
trinta anos, meus amigos, seria muito triste para nós rubro-negros e pra quem
gosta de futebol, no geral, ver um talento desses ser jogado pela janela, ser
desperdiçado assim, a troco de nada. E ele próprio parece ter tomado
consciência disso, pois é nítida a sua vontade de dar certo dessa vez. Não
esperemos o Adriano de 2009, seria injusto, mas, se ele mostrar perseverança
para chegar perto disso, já será um grande reforço. E convenhamos: Adriano
“Imperador”, só com o nome já põe muita gente pra tremer e, com só uma perna,
ainda bota muito centroavante dessa primeira divisão no bolso! Eu falo porque
eu já vi, num Maracanã lotado, ele chamar a responsa, fazer três gols e virar
um jogo praticamente perdido. Quem estava lá no dia 31-01-2010 sabe exatamente
do que estou falando. Adriano é um jogador de cojones, coisa rara nos dias de hoje. E repito, reaças, no Flamengo
ele joga, para desespero de vocês.
Agora, vamos falar de hipóteses, torcedor
também gosta de sonhar: como o Adriano poderia se encaixar nesse Flamengo, que
parece estar muito certinho e se acertando mais a cada jogo? A primeira opção
seria na dele mesmo, centroavante, centralizado, com o Love passando a jogar pelos
lados do campo, o que não seria difícil, pois o Love, mesmo sendo o “nove” do
time de hoje, sai bastante para buscar o jogo; e entrosamento entre os dois não
é problema, o “Império do Amor” já deu certo. No entanto, permitam-me um
devaneio: o Adriano usa a “10”, correto? Então, ele poderia ser opção para resolver
o problema do Flamengo por ali também. Não sei se vocês lembram, mas, no
primeiro ano de José Mourinho na Inter de Milão, o time, em algumas ocasiões,
foi armado em função do Imperador. Explico: Adriano atuou como um autêntico enganche, centralizado, dando passes
para o Ibrahimovic, centroavante, e com Zanetti (monstro), Mancini, Stankovic e
Maicon fazendo as jogadas pelos lados do campo. Além disso, a força física do
Imperador permitia a ele girar sobre a marcação adversária e utilizar sua
grande arma, o potente chute com a perna esquerda, de média e longa distância.
Bem só um delírio que depende e muito da condição física do Adriano. Mas fica o
alerta: ele não é só um atacante trombador, tem muito mais recursos que isso.
E a volta do Adriano, apesar de
ser considerada por muitos como “mais do mesmo”, é boa para todo mundo: para
ele próprio, que tem mais uma chance de mostrar que pode voltar a ser o
Imperador; para o Flamengo, que ganha com a volta de um ícone; para o futebol,
que, apesar dos pesares, ainda reverencia sua figura como a de um grande
talento; e, por que não, dos nossos adversários que, além de terem mais um
motivo para ir ao estádio, podem, finalmente, desengavetar todas as piadas prontas
e montagens malfeitas que já estavam mofando, para o desespero de nossos
humoristas de plantão, que perderiam sua verve de comediante caso o Imperador
não voltasse... Todos sabemos que esse retorno não depende exclusivamente dele,
apoio é necessário, seja da família ou da própria instituição Flamengo, mas ele
tem de fazer sacrifícios para chegar lá: mudar hábitos, ter horários e fechar a
boca, tanto para o que come e bebe, quanto para o que fala. No sapatinho,
Didico... O que fica é a torcida pela recuperação não só do Imperador, o
jogador de futebol, mas do Adriano Leite Ribeiro, o homem, filho, pai, ídolo e
que é tido como exemplo por muitos garotos que sonham com um futuro semelhante.
E, Didico, se é para o bem de
todos e felicidade geral da Nação Rubro-Negra, diga ao povo que, finalmente,
está de volta! E o faça como você sabe e está acostumado: adversários tremendo,
redes balançando e a magnética explodindo!
*Thiago Aresta fez curso por correspondência de endocrinologia e sempre assina seus texto com SNR, que este editor sempre esquece de inserir.
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